Crack, perigo para quem “vivencia” as ruas
André Teixeira
De acordo com as ultimas pesquisas realizadas na cidade de Mogi das Cruzes pela Secretaria de Assistência Social do município, houve um aumento considerável do índice de moradores em situação de rua entre o fim de 2007 e maio de 2010, em 400%, passando de 88 para 440 pessoas entre crianças menores de 16 anos e adultos com idade entre 31 e 50 anos sem condições dignas de moradia e assistência social adequadas. Esses moradores em situações de rua, principalmente os menores, vivenciam o perigo e a vulnerabilidade à principal e mais perigosa droga ilícita; o crack, sendo este um dos principais problemas enfrentados por essa população, além da falta obvia de segurança e condições dignas de saúde. Crianças e adolescentes das ruas do Brasil começaram a fumar crack no fim da década de 1980, mais efetivamente nos estados do Sul e Sudeste. Segundo o Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) houve aumento gradual do uso da drogas nas ruas entre 1997 e 2010, sendo que em determinadas cidades, como São Paulo e no Distrito Federal - e em expansão para cidades menores, porém populosas como Mogi - mais da metade das crianças em situação de rua são usuárias freqüentes. Em maio deste ano, o Governo Federal anunciou o DECRETO Nº 7.179, ou Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas, disponibilizando R$ 100 milhões aos serviços do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Com a medida, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome(MDS) apoiará a oferta de serviço assistencial no Centro de Referência Especializado de Assistência Social para a População em Situação de Rua (CREAS) em municípios com mais de 250 mil habitantes, como Mogi das Cruzes, com mais de 375 mil.Tais números e informações justificam todos os meios e alternativas implantados por órgãos governamentais para sanar o problema e justifica ações de entidades do Terceiro Setor, como, por exemplo, a Associação Beneficente Onde Morás? (ABOMORAS)em Mogi das Cruzes e a Casa de Acolhimento de Menino de Rua Nossa Senhora de Guadalupe em Suzano, que trabalham na busca por soluções adequadas e eficazes. Outro exemplo de extrema importância para o município é a Associação São Lourenço no distrito de Taiaçupeba. Uma entidade de origem italiana há 14 anos na cidade, que atende crianças e adolescentes advindas de diversas situações, como, por exemplo, exploração sexual, toxicômanos, menores abandonados e órfãos. Segundo Maurizio Alesso, diretor do local, “muitas crianças chegam até nós por indicação de órgãos oficiai”, como o CREAS Mogi. A entidade conta com o apoio de voluntários e a colaboração de missionários católicos de diversas partes do mundo. Segundo Alesso, a entidade nada tem a ver com caridade, pois “mantemos os portões abertos e ninguém e obrigado a ficar. Aqui, não nos consideramos uma entidade meramente religiosa ou de cunho assistencialista. Buscamos reconstruir o conceito de família”. Com cerca de 70 crianças e adolescentes entre 0 e 18 anos, a entidade já ajudou inúmeras pessoas a reconquistarem sua dignidade, como ex-viciados e menores abandonados. “Muitos saem daqui empregados e muitos já até se casaram”, conta Alesso sobre os resultados ao longo dos 14 anos em que a entidade contribui com Mogi das Cruzes no resgate de cidadãos.O método da Associação São Lourenço faz sentido para o professor Douglas Antunes de Educação Física, do projeto Dom Quixote, em São Paulo, que atende crianças moradoras de rua e viciadas em drogas no bairro da Santa Ifigênia, Luz, vulgarmente conhecido como Cracolância. Segundo ele, “o mais difícil é impor regras, pois por terem vivido a maior parte da vida na rua, as crianças têm dificuldade em se adequar”. Conta que certa vez um adolescente de nome Roberio Silva disse que ia embora, que não queria ficar e obedecer. “Então eu lhe disse, ‘você acha que me emociona? Lá (na rua) você vai dormir no chão e passar frio. Aqui tem piscina, aula de informática e seis refeições por dia. Pode ir se quiser'”. E ressalto Douglas que “a escolha é deles.” O método usado pela Associação São Lourenço e respaldado pelo Projeto Dom Quixote dá ao residente de uma instituição de resgate como as citadas, a opção de escolha com respeito ao livre arbítrio. Pois o que ocorre geralmente nas ruas e que as crianças não têm escolha ou não têm opções dignas de escolha. Isso as leva para um caminho muitas vezes sem volta da criminalidade e das drogas, pois mesmo sendo uma droga presente em todos os níveis da sociedade, é entre as crianças e adolescentes em situação de rua que o consumo se torna até um meio de sobrevivência, embora contraditório, devido seu grande poder de destruição e mortandade pelo consumo. Segundo um morador de rua na cidade de São Paulo de nome Carlos Eduardo Praça, no bairro do Braz, “a droga faz parte de nossa cultura, para quem vive na rua. Precisamos para sobreviver ao frio, à fome, pela falta de um lar”.
* Os nomes de usuários de crack, ex-usuários, e residentes das entidades desta reportagem especial são todos fictícios
* Os nomes de usuários de crack, ex-usuários, e residentes das entidades desta reportagem especial são todos fictícios